domingo, 10 de julho de 2011

O Futebol (de)formação

Muito se fala de formação, e de escolas e academias de formação de jogadores, clubes que são estandartes na, dita,  formação, enfim, todos falam em formação.



No entanto, poucos são aqueles que devem saber o verdadeiro significado da palavra e sua real aplicação.



Segundo o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa por formação entende-se, entre outros, o seguinte:


1. Dar corpo ou forma a.
(...)
3. Organizar.
(...)
5. Conceber; imaginar.
6. Preparar.
(...)
8. Instruir, educar.
9. Traçar.
10. Descrever, criar.
(...)
12. Estabelecer.
13. Planear; promover a formatura de.
v. intr.
14. Entrar na forma, em linha.
v. pron.
15. Tomar forma.
16. Receber ensinamentos. = EDUCAR-SE

Da variedade de termos acima enunciados, verificamos que um número significativo deles não combina, num número considerável de casos, com o Futebol! E não combina, porque se utiliza o "chavão - formação" e não a dimensão do conceito. 

Formação não é: Persuadir, Chantagear, Ameaçar, Insultar, Minimizar, Envergonhar, etc. Quantos de nós, ouvimos, ou constatamos, situações como as descritas em cima? Todos nós ouvimos estórias de casos desses com uma frequência mais do que o desejável. No entanto, acontecem, principalmente, no Futebol de Formação.  

A nós pais, cabe, em primeiro lugar denunciá-las, em segundo não compactuar com elas. Quando não o fazemos estamos a contribuir para que uma qualquer "pessoa" destrua expectativas e muitas vezes, o mais importante numa criança, a vontade de jogar futebol e de se divertir. Em contra ponto conseguem-se depressões infanto-juvenis, problemas emocionais em crianças de tenra idade e tudo ao abrigo do Futebol de Formação.

Nós pais, somos tão exigentes, e bem, na escola que se um professor ou funcionário ousar tratar o nosso filho de forma menos correcta, o que fazemos? Numa primeira instância falamos com o Director de Turma, e nalguns caso, mais extremos, recorremos de imediato à Direcção da Escola. No entanto, no Futebol,  somos completamente diferentes! Toleramos TUDO, ou quase TUDO, e o que fazemos? Quase sempre nada. Porquê? Por medo, por receio de "represálias" sobre o nosso filho, por vergonha, enfim, por várias situações desconfortáveis para nós. Mas o problema não somos "nós" o problema será sempre com o NOSSO filho, ou educando, e aí reside a nossa complacência com um sistema que se tem mostrado ao nível dos tempos medievais, nalguns casos, "eles" querem podem e mandam! E "nós" toleramos, o mais grave é que na maioria das vezes ainda pagamos! Algo de difícil e racional explicação, sem dúvida!

O Futebol move paixões, é uma frase feita, e todos nós temos e tivemos as nossas paixões. No entanto, infelizmente, paixão e razão nem sempre andam de mãos dadas. O Futebol será um excelente exemplo disso mesmo.  

O último grande estudo sobre Desporto Federado em Portugal é de 2009, destaco este peça jornalística do Jornal Público: 

"O desporto português tinha em 2009 mais de 500 mil atletas masculinos e femininos federados, e o futebol liderava destacado o “campeonato” das modalidades com mais praticantes, com cerca de 100 mil.
De acordo com o livro Estatísticas do Desporto 1996-2009 do Instituto do Desporto de Portugal (IDP), nesse período de 14 anos, o número total de atletas federados praticamente duplicou de 265.588 para 512.558. 

O futebol continua a ter larga “responsabilidade”, com 144.106 praticantes, o que corresponde a quase 30 por cento (28,11) do total, e tem quase quatro vezes mais que a segunda modalidade, o basquetebol. "

De 2009 para cá o panorama mantém-se idêntico e o Futebol ocupa a maior "fatia" do Desporto Federado em Portugal.

Fazendo um pequeno cálculo, poderei afirmar que de um número de 150.000 praticantes que possam existir neste momento em Portugal, talvez nunca cheguem a futebolistas de eleição 0,01% desse número, 1500, portanto. Se atendermos que a 1ª Liga e a 2ª Liga têm 32 clubes e que em cada plantel teremos 24 jogadores, temos 768 jogadores, ou seja, sensivelmente metade dos 1500. Se, por outro lado, verificarmos que, por exemplo, os três grandes têm mais jogadores estrangeiros do que portugueses (SLB tem neste momento no seu plantel sénior 26 jogadores estrangeiros!!!), conclui-se, com facilidade, que o Futebol para os nossos filhos será, apenas e só, uma passagem. Cabe a nós pais, tornar essa passagem agradável ou tortuosa. Nos "Lobatos Foot" fazemos o nosso papel que tão bem avaliado tem sido pelos pais, escola, e encarregados de educação. Em relação aos outros, cabe a cada um fazer a sua própria avaliação. 

Apesar de alguns casos de sucesso, a maioria das crianças e jovens ainda são "orientados" segundo modelos e metodologias, desadequados e ultrapassados. Para se ser técnico de Futebol de Formação, não basta ter sido praticante da modalidade, sabe-se lá em que condições, tirar um curso de treinador, licenciado em Educação Física ou militar e julgar, que se está perfeitamente habilitado a ensinar e liderar crianças e jovens, melhor, a formá-los e a conduzi-los. Livros com exercícios de Futebol, metodologias e até pedagogia, todos podem ter e usar, no entanto, a forma como tratamos a informação e como a transmitimos requer competências de ordem científico-pedagógica que apenas está ao alcance de alguns.  


Deixo-vos para reflectirem sobre a formação dos nossos filhos!

Armando Lopes









4 comentários:

  1. Concordo plenamente com tudo o que está descrito em cima.

    O futebol de formação não pode ser visto apenas com um único objectivo - o de formar atletas - nem aos olhos dos presidentes,directores, treinadores , pais e até aos olhos dos próprios atletas. Através desta prática e, de tantas outras, formam-se crianças, jovens, cidadãos de uma sociedade cada vez mais exigente, sendo necessário preparar os jovens para se inserirem nelas e para saberem adaptar-se às situações que surjam ao longo da sua vida.

    Primeiramente, ao nível dos treinadores, não basta um conhecimento técnico-táctico de determinada modalidade, a pedagogia, o saber estar , o saber ensinar , o saber educar são pilares fundamentais para poderem exercer as sua funções nas camadas mais jovens, pois todas as suas práticas irão influenciar de modo positivo ou negativo os seus atletas.

    Os pais são outro pilar fundamental no desenvolvimento desportivo do atleta, são eles que movem os seus filhos/educandos para a prática desportiva , que apoiam os mesmos nos melhores e nos piores momentos, no entanto, por vezes criam expectativas demasiado elevadas nas crianças, o que pode conduzir a uma frustração por parte dos mesmos por não conseguirem atingir os objectivos que foram traçados para os mesmos.

    Por último, os presidentes e, coordenadores têm que entender de uma vez por todas que têm de estar pessoas formadas a assegurar o cargo de treinador de formação e para tal têm de ser remunerados, as crianças dos 6-9 anos de idade estão num período fundamental de desenvolvimento das suas capacidades e aptidões como tal é necessário apostar nas melhores práticas para os mesmos e, tal se consegue através de pessoas bem formadas.

    Cumprimentos

    André Henriques

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  2. Concordo integralmente com tudo o que aqui foi escrito.

    Quando criei o blog da comunidade dos Iniciados do Almada, sempre pensei em passar essa mensagem, de que temos o dever de fazer ver aos miúdos que o mais importante é que se divirtam e que aprendam, que sejam melhores cidadãos.

    Sempre o escrevi, e volto a repetir, em muitos clubes vive-se a doença do «ganhar, ganhar, ganhar»... E vale tudo para se ganhar.

    Por isso, como muito bem refere o Armando, muitos de nós conhecemos exemplos de comportamentos inaceitáveis, que nunca tolerariamos se se passasse na escola... mas no futebol... deixamos andar!

    E não, não atribuo essa responsabilidade apenas a dirigentes e treinadores dos clubes, a maior parte das vezes a responsabilidade é nossa, dos pais, que incutimos nos miúdos essa doença, de que o que interessa é só ganhar!!!

    E não é!
    Costumo dar este exemplo, e digo-o muitas vezes ao meu filho:

    «Estás triste por teres perdido? Daqui a 10 anos pergunto-te qual foi este resultado e não te lembrarás... Mas jamais esquecerás os amigos que fizeste no Almada, os treinadores que tanto admiras, os torneios em que participaste, essa maravilhosa experiência, tudo isso ficará para a vida... isso é que deves valorizar! As vitórias e as derrotas.. isso... Não interessam para absolutamente nada!»

    Ganhar e perder são apenas as consequências de tudo o resto! Não nos devemos preocupar isso sequer 1 minuto.

    Obviamente que quem está no Desporto, está para ganhar. É a essência da competição.
    Mas não deve ser um objectivo em que vale tudo! Jamais!
    Formar bem... e as vitórias aparecerão com toda a naturalidade...

    Por isso, nunca deixarei de dizer o mesmo (sei que muitos pais me devem ter um asco... mas lamento, é o que penso!) sempre que estou a ver um jogo e vejo treinadores e pais a apelarem aos miudos para fazerem anti-jogo... para atirarem a bola para fora, para irem devagarinho marcar a falta... para se atirarem para o chão a fingir que estão aleijados... todos esses truques, isso deixa-me possesso! Não me calo quando o vejo! É inadmissível... ensinem os miudos a terem mérito com trabalho... não os ensinem a ganhar com truques.

    Essa lição vai lhes ficar para a vida! Quando mais tarde entrarem no mercado de trabalho, saberão que têm de se dedicar, que têm de ser bons para terem sucesso profissional... em vez de se tornarem preguiçosos, a procurarem truques
    a fingirem que trabalham... e a prejudicarem-se a eles e às suas empresas.

    Não nos esqueçamos, tudo o que ensinamos hoje a miudos de 14 anos... são lições que lhes ficam para a vida!

    Ainda para mais, no momento histórico em que vivemos, de uma crise profunda que não sabemos quando vamos sair dela, ensinem-lhes boas lições de vida, algo que lhes sirva para a vida!

    Deixem-se dos truques e das pequenas vitoriazinhas sacadas à custa de truques-baixos!

    No Almada nunca o vi... e confesso-vos, no dia em que ensinem coisas dessas ao meu filho, imediatamente sairá desse clube...

    Formar, formar, formar... essa sim, deve ser a regra!


    Esquecer a obsessão da vitória.

    E é em tudo o resto que nos devemos focar. Se os clubes têm boas pessoas a formar miudos, se o grupo é bom, se os miúdos evoluem, se se divertem,

    A formação é isto. É estar num grupo a aprender semana a semana, a ganhar amigos, e conhecer novas experiências, a formar valores de cidadania, ao sentimento de pertença no grupo!

    Parabéns Armando, um bom artigo!
    Obrigado André, pela sua contribuição!

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  4. Boa abordagem Armando, gostei... e acrescento que, se muitos pais/Encarregados de Educação são coniventes (calam e consentem)com algumas situações, é porque, se calhar, o Futebol de Formação (e/ou outros desportos) ainda é encarado como o "ir à tropa" dos tempos antigos, onde se pensava que a recruta moldava "Homens". Muitos desses pais, infelizmente, põem os filhos a praticar actividades (não só o futebol) para conseguir realizar sonhos seus (alguns bastante absurdos).
    Acredito que a prática desportiva deva começar, antes de tudo, por ser um prazer/gosto para o PRATICANTE. O resto, camaradagem/respeito/organização/... são mais valias que enriquecem ainda mais a pessoa.

    Armanda Rocha

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